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As Anotações Acadêmicas de 08/04/2025 trazem uma análise aprofundada sobre a Teoria da Ação no Direito Processual Civil, tema central para a compreensão da dinâmica jurisdicional no ordenamento jurídico brasileiro.
A ação, nesse contexto, representa o instrumento por meio do qual o indivíduo provoca a atuação do Estado-juiz, requerendo a tutela de um direito subjetivamente entendido como violado, ameaçado ou não reconhecido.
Estudar a Teoria da Ação é essencial para entender como se estrutura o acesso à jurisdição — princípio fundamental assegurado pela Constituição Federal.
Trata-se de identificar não apenas o direito de pedir a tutela jurisdicional, mas também os pressupostos, elementos e classificações que compõem esse instituto e delimitam a sua aplicação prática.
Neste artigo, com base no conteúdo ministrado em sala, serão explorados o conceito e a natureza jurídica da ação, sua evolução teórica ao longo do tempo, os elementos essenciais que a caracterizam, bem como suas diversas classificações doutrinárias e legais.
A abordagem será orientada por uma perspectiva crítica, sempre relacionada à sistemática atual do Código de Processo Civil de 2015.
Conceito e Natureza Jurídica da Ação
No âmbito do Direito Processual Civil, a ação é compreendida como o direito que o indivíduo possui de provocar a jurisdição, solicitando do Estado uma resposta frente a um conflito de interesses.
Trata-se, portanto, de um instrumento fundamental para o exercício da cidadania, pois é por meio da ação que se torna possível acessar o Poder Judiciário e obter a tutela jurisdicional adequada.
O Estado, no exercício da jurisdição, é um ente inerte, ou seja, não age por conta própria. A atuação do juiz depende de provocação por parte do titular de um direito de ação.
Assim, essa provocação ocorre quando o sujeito propõe uma demanda, formalizando seu pedido de intervenção jurisdicional. A inércia do Estado-juiz, por sua vez, fundamenta a necessidade de existência da ação como mecanismo apto a desencadear o processo.
A natureza jurídica da ação é multifacetada e, conforme a doutrina majoritária, pode ser qualificada sob quatro aspectos principais:
Direito subjetivo: porque é uma prerrogativa reconhecida ao indivíduo de exigir do Estado uma prestação jurisdicional.
Direito público: pois se dirige a um dos poderes do Estado – o Judiciário – e está inserido na esfera das garantias fundamentais do cidadão.
Autônomo: uma vez que não depende, para seu exercício, da efetiva existência do direito material alegado.
Abstrato: porque a ação pode ser proposta mesmo sem certeza sobre a existência do direito invocado, bastando a plausibilidade da pretensão.
Dessa forma, a ação conecta-se diretamente à prestação jurisdicional, constituindo-se no elo entre o indivíduo e o Estado, e assegurando o acesso à justiça, independentemente do resultado final da demanda.
Teorias da Ação: Evolução Histórica e Doutrinária
A compreensão moderna da ação como direito de acesso à jurisdição resultou de um processo histórico de construção teórica, no qual diversas doutrinas se sucederam e se contrapuseram.
As três principais correntes — teoria imanentista, teoria autônoma e teoria eclética — marcaram diferentes momentos na evolução da ciência processual, influenciando diretamente os sistemas normativos, inclusive o brasileiro.
1. Teoria Imanentista ou Civilista
A teoria imanentista, também conhecida como teoria civilista, teve como principais expoentes os juristas Celso, Ulpiano e Savigny. Para essa corrente, a ação estava atrelada (ou imanente) ao direito material, ou seja, só havia ação se houvesse um direito subjetivo a ser tutelado.
Segundo essa concepção, a ação era entendida como uma projeção ou manifestação do próprio direito material, e não como um direito autônomo. Assim, sem direito material lesado ou ameaçado, não existiria ação. Essa visão estava alinhada com o que previa o antigo art. 75 do Código Civil de 1916, que associava a ação à existência do direito subjetivo.
Contudo, essa teoria mostrou-se limitada e incompatível com a realidade processual, por ignorar importantes situações jurídicas. Por exemplo:
- Não considerava a possibilidade de o autor propor uma ação declaratória negativa, com o objetivo de declarar a inexistência de uma relação jurídica (vide art. 4º, I do CPC/73 e art. 19, I do CPC/2015).
Exemplo: imagine que uma empresa de telefonia está cobrando judicialmente uma dívida que você afirma não ter. Para se defender, você propõe uma ação declaratória negativa, pedindo ao juiz que declare judicialmente que a relação jurídica (a dívida) não existe. Pela teoria imanentista, como você “não tem direito material a cobrar nada”, não poderia propor essa ação — o que é claramente inadequado.
- Não admitia a hipótese de o juiz julgar improcedente o pedido, mesmo com a ação devidamente proposta.
Exemplo: um autor entra com ação de indenização por danos morais contra um vizinho, alegando ofensa. O juiz, ao analisar as provas, entende que não houve dano e julga o pedido improcedente. Pela visão imanentista, como não havia um direito material evidente, o autor nem poderia ter proposto a ação, o que contradiz a realidade do processo: mesmo sem razão no mérito, a ação é válida e o Judiciário deve apreciá-la.
- Também desconsiderava a perda da pretensão pela prescrição, o que não impede o exercício da ação.
Exemplo: alguém propõe uma ação de cobrança de um cheque emitido há mais de 5 anos, quando o prazo de prescrição já passou. O juiz reconhece a prescrição e extingue o processo. A teoria imanentista diria que nem poderia ter havido ação, pois o direito estava “morto”. Mas, no processo moderno, o exercício do direito de ação é legítimo, mesmo que o mérito (no caso, a cobrança) seja negado por prescrição.
Essas falhas conceituais demonstraram a fragilidade dessa teoria, razão pela qual não foi acolhida no processo civil moderno.
Ainda assim, na prática forense, muitos profissionais continuam nomeando ações com base no direito material buscado, como “ação de despejo”, “ação de cobrança” ou “ação de indenização”, resquícios da influência dessa visão imanentista.
2. Teoria Autônoma do Direito de Ação
Em contraposição às limitações da teoria imanentista, surgiu a teoria autônoma do direito de ação, desenvolvida principalmente pelos juristas alemães Windscheid e Müther. Essa doutrina promoveu uma verdadeira revolução na forma de se compreender a ação no processo civil.
Para esses autores, a ação não se confunde com o direito material em movimento, como queria a escola civilista de Savigny. Ao contrário, trata-se de um direito público subjetivo autônomo, conferido a todo indivíduo que busca a prestação jurisdicional do Estado, ainda que não possua razão no mérito.
A ação, nesse modelo, é entendida como o “direito à tutela jurisdicional”, que se manifesta de três formas:
Reconhecimento ou certificação de um direito (ação de conhecimento).
Realização concreta de um direito previamente certificado (ação de execução).
Tutela cautelar ou preventiva, para assegurar o resultado útil de uma futura prestação jurisdicional.
Essa concepção atribui à ação um caráter abstrato: o simples fato de haver uma pretensão resistida já autoriza o acesso ao Judiciário, independentemente da existência ou validade do direito material alegado.
Assim, mesmo que o autor esteja equivocado ou que o juiz venha a julgar improcedente o pedido, o exercício do direito de ação continua plenamente legítimo.
Outro ponto marcante é que, nessa visão, a ação é dirigida contra o Estado, pois somente ele, titular do monopólio da jurisdição, pode prestar a tutela jurisdicional requerida. O réu não é o destinatário da ação, mas apenas o sujeito passivo da relação processual formada para compor o litígio.
Portanto, a partir da teoria autônoma, compreende-se que, do exercício da ação nascem dois direitos complementares:
-
(a) O direito do cidadão de provocar a jurisdição do Estado (direito público subjetivo).
-
(b) O dever do Estado de compor o conflito, realizando o que lhe compete como função jurisdicional.
3. Teoria Eclética
A teoria eclética, proposta por Giuseppe Liebman e adotada no CPC de 1973, representa uma posição intermediária entre as teorias anteriores. Nessa perspectiva, a ação é vista como o direito de obter uma sentença de mérito — seja ela procedente ou improcedente —, desde que preenchidos determinados requisitos processuais.
A teoria eclética reconhece a autonomia do direito de ação, mas impõe condições para seu exercício: legitimidade das partes, interesse processual e, anteriormente, a possibilidade jurídica do pedido.
Essas condições, portanto, não dizem respeito à existência do direito material, mas sim à admissibilidade da análise do mérito por parte do Judiciário.
Com a entrada em vigor do CPC de 2015, essa teoria foi parcialmente mantida, mas com importantes ajustes. O novo código deixa de empregar a expressão “condições da ação” e, em seu lugar, estabelece que a ausência de legitimidade ou interesse permite o julgamento sem resolução do mérito, conforme o art. 485, VI. Já o art. 17 reforça que “para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade”.
Essa mudança reflete uma mitigação da teoria eclética clássica, conforme defendido pela doutrina moderna, ao tratar os antigos pressupostos não como condições de existência da ação, mas como requisitos ao exercício legítimo do direito de ação.
Portanto, essas três correntes teóricas revelam a transformação do conceito de ação ao longo do tempo, consolidando, na atualidade, um modelo mais aberto, democrático e coerente com os princípios do devido processo legal e do acesso à justiça.
Elementos Essenciais da Ação
A ação, enquanto instrumento de provocação da jurisdição, possui elementos que a identificam e que são indispensáveis para sua validade e processamento.
Esses elementos compõem a estrutura mínima que deve constar na petição inicial, conforme determina o art. 319 do Código de Processo Civil, sendo eles: as partes, a causa de pedir e o pedido.
Portanto, a ausência ou imprecisão de qualquer desses componentes pode acarretar inépcia da petição e, consequentemente, a extinção do processo sem resolução do mérito.
1. Partes
As partes são os sujeitos que integram a relação jurídico-processual e que participam ativamente do contraditório. Elas estão submetidas à autoridade do juiz e são titulares das situações jurídicas processuais decorrentes do andamento da causa.
Podem ser classificadas em:
Partes principais: aquelas que formulam ou contra quem se formula o pedido, como o autor e o réu nas ações de conhecimento, o exequente e o executado nas ações de execução, ou o requerente e o requerido nas ações cautelares.
Partes auxiliares (ou coadjuvantes): como o assistente simples, que intervém no processo em auxílio de uma das partes principais, sem modificar a lide.
O jurista italiano Carnelutti também diferencia:
Parte simples: aquela que atua sozinha na relação processual.
Parte complexa: quando há uma pluralidade organizada de indivíduos atuando em conjunto, como o incapaz representado por seu responsável legal.
Capacidade de ser parte x Capacidade processual
A capacidade de ser parte refere-se à aptidão genérica para figurar em juízo, ou seja, ser sujeito de direitos e deveres (art. 75 do CPC).
Já a capacidade de estar em juízo (ou capacidade processual) diz respeito à aptidão para exercer pessoalmente os atos do processo, e está diretamente vinculada à capacidade civil, plena, prevista no art. 5º do Código Civil e no art. 70 do CPC.
➡️ Assim:
Os absolutamente incapazes devem ser representados.
Os relativamente incapazes, assistidos (art. 71 do CPC).
Entes despersonalizados
A lei processual permite que alguns entes sem personalidade jurídica figurem como partes, desde que por meio de seus representantes legais. Exemplo (art. 75, incisos V a XI, CPC/2015):
Espólio, massa falida, condomínio, herança jacente ou vacante, entre outros.
Litisconsórcio e substituição processual
É possível que haja pluralidade de sujeitos em um ou ambos os polos da ação, situação denominada litisconsórcio. Ele pode se formar:
Desde o início do processo (litisconsórcio inicial), ou
No decorrer do processo (litisconsórcio ulterior), como no caso de denunciação da lide ou chamamento ao processo.
Além disso, a parte no processo nem sempre coincide com a titular do direito material discutido. Em certos casos, a lei permite que alguém pleiteie em nome próprio direito alheio, situação chamada de legitimação extraordinária (ou substituição processual), conforme previsto no art. 18 do CPC.
➡️ Exemplo: o Ministério Público atuando em ações coletivas, defendendo interesses de grupos sociais.
Sucessão no processo
Havendo mudança na titularidade do direito material no curso do processo (por exemplo, na alienação do bem litigioso, ou em razão de morte do autor ou réu), o sucessor processual assume a mesma posição jurídica da parte originária — o que não descaracteriza a identidade de parte para fins processuais.
2. Causa de Pedir
A causa de pedir corresponde ao conjunto de fundamentos de fato e de direito que justificam o pedido do autor. São as razões pelas quais ele acredita fazer jus à tutela jurisdicional que está pleiteando.
No processo civil brasileiro, adota-se a teoria da substanciação, consagrada no art. 319, III do CPC/2015, segundo a qual o autor deve indicar, na petição inicial:
os fatos que embasam a sua pretensão (causa de pedir remota), e
os fundamentos jurídicos que extraem consequências desses fatos (causa de pedir próxima).
Essa teoria se opõe à teoria da individuação, segundo a qual bastaria ao autor indicar apenas os fatos ou apenas os fundamentos jurídicos — hipótese não aceita atualmente no direito processual brasileiro.
Causa de pedir remota (ou fática)
É o quadro de fatos alegados pelo autor, que compõe a narrativa da sua petição inicial. Esses fatos podem ser classificados em:
Constitutivos: os que dão origem ao direito alegado (ex.: empréstimo realizado, contrato firmado, ato ilícito que gera indenização).
Extintivos: os que fazem cessar o direito anteriormente constituído (ex.: pagamento da dívida, remissão).
Modificativos: os que alteram o conteúdo ou condições do direito (ex.: parcelamento de dívida).
Impeditivos: os que impedem o nascimento do direito (ex.: incapacidade civil, simulação, erro essencial).
Conforme o art. 373 do CPC, cabe ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito, enquanto ao réu cabe demonstrar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos.
Causa de pedir próxima (ou jurídica)
São os fundamentos jurídicos extraídos dos fatos narrados, ou seja, as consequências jurídicas que o autor atribui àqueles fatos.
Não se exige que o autor aponte um artigo de lei específico — o juiz, segundo o princípio “jura novit curia” (o juiz conhece o direito), não está vinculado à norma invocada. O importante é que a narrativa fática permita identificar a tutela pretendida.
Exemplo: se o inquilino deixa de pagar o aluguel (fato), a consequência jurídica atribuída pode ser o despejo por inadimplemento contratual (fundamento jurídico).
Importância da Causa de Pedir
A formulação adequada da causa de pedir:
Delimita o objeto do processo,
Orienta a defesa do réu, e
Vincula o juiz no julgamento da lide, pois ele não pode decidir além, aquém ou fora dos fundamentos apresentados pelas partes (princípio da congruência).
3. Pedido
O pedido é um dos elementos essenciais da ação e representa a pretensão jurídica do autor, ou seja, aquilo que se requer do Estado-juiz como consequência da valoração jurídica dos fatos narrados.
Trata-se da conclusão lógica da petição inicial, extraída dos fatos (causa remota) e dos fundamentos jurídicos (causa próxima). Corresponde à pretensão material formulada ao Poder Judiciário, e exerce papel central no processo.
Tipos de pedido
O pedido se desdobra em duas categorias:
Pedido imediato: é a tutela jurisdicional pretendida, ou seja, o tipo de provimento que se espera do juiz (ex: condenação, declaração, constituição de direito, execução, etc.). Está ligado ao direito processual.
Pedido mediato: é o bem da vida efetivamente almejado, isto é, o resultado concreto da decisão judicial (ex: pagamento de dívida, reintegração de posse, indenização, etc.). Está ligado ao direito material.
Exemplo: Em uma ação de cobrança, o pedido imediato é a condenação do réu; o pedido mediato é o recebimento do crédito.
Requisitos legais
Conforme o art. 322 do CPC, o pedido deve ser:
Certo: ou seja, expresso, ao menos quanto ao gênero do objeto pretendido.
Determinado: isto é, individualmente especificado em relação ao objeto, quantidade e natureza.
Entretanto, o art. 324, §1º do CPC admite, em hipóteses excepcionais, a formulação de pedido genérico. Isso ocorre, por exemplo:
Quando não for possível determinar desde logo o valor do objeto, como em ações de indenização por danos materiais ou morais a serem apurados posteriormente;
Quando a determinação depender de ato do réu;
Ou nos casos de ações universais, como herança ou condomínio.
Funções práticas do pedido
O pedido tem relevância prática em diversas áreas do processo:
Limita a atuação do juiz: de acordo com o princípio da congruência ou adstrição (arts. 141 e 492 do CPC), o juiz não pode decidir além (ultra), aquém (citra) ou fora (extra) do que foi pedido.
Fixa o valor da causa: o pedido mediato é o principal parâmetro para estimar o valor da ação (art. 291, CPC).
Identifica a demanda para fins de:
Litispendência
Conexão
Continência
Coisa julgada
Para esses efeitos, devem coincidir todos os elementos da ação: partes, pedido (imediato e mediato) e causa de pedir (próxima e remota), conforme estabelece o art. 337, §3º do CPC.
Exemplo de distinção entre conexão e litispendência
Imagine que o autor mova duas ações contra o mesmo réu, ambas decorrentes de um acidente de trânsito.
Em uma ação, pede danos emergentes (gastos imediatos, como conserto do carro).
Em outra ação, pede lucros cessantes (valores que deixou de ganhar por estar sem o veículo).
Nesse caso:
As partes são as mesmas.
A causa de pedir remota (o acidente) e próxima (obrigação de indenizar com base no art. 186 do CC) são idênticas.
O pedido imediato (condenação) é igual.
Mas os pedidos mediatos são distintos.
Portanto, não há litispendência, mas sim conexão, pois os objetos (bens da vida pleiteados) são diferentes.
Portanto, esses três elementos – partes, causa de pedir e pedido – são fundamentais para a existência válida da ação e para a estruturação adequada do processo, permitindo ao juiz e ao réu compreenderem o objeto da controvérsia e garantirem a devida prestação jurisdicional.
Classificação das Ações
A ação, enquanto direito público subjetivo de provocar o exercício da jurisdição, pode ser classificada sob diversos critérios, conforme a natureza do provimento jurisdicional pretendido, a prescritibilidade do direito material, o tipo de relação jurídica discutida, ou o bem jurídico almejado (pedido mediato).
Embora o termo “ação” possa, às vezes, ser usado de forma imprecisa — referindo-se ao processo, ao direito material ou à tutela pretendida (ex.: ação de usucapião, ação de cobrança) —, a classificação doutrinária tem função estruturante para fins processuais e práticos, como determinação de competência, verificação de prescrição ou aplicação de regras específicas de capacidade processual.
1. Quanto à natureza do provimento jurisdicional
Essa é a classificação mais utilizada pela doutrina, pois considera o tipo de resposta jurisdicional que se busca do Estado.
Ações de cognição (ou conhecimento)
Visam ao acertamento ou reconhecimento de uma situação jurídica. Subdividem-se em:
Ação declaratória: busca declarar a existência, inexistência ou modo de ser de uma relação jurídica (ex.: ação declaratória de inexistência de débito).
Ação condenatória: visa impor ao réu uma obrigação de pagar, fazer ou não fazer (ex.: ação de cobrança).
Ação constitutiva: tem por finalidade criar, modificar ou extinguir uma relação jurídica (ex.: ação de divórcio, anulação de casamento, cancelamento de registro).
Ação de execução
Destinada à satisfação de um direito já reconhecido em título executivo judicial ou extrajudicial (ex.: execução de cheque).
Pode ocorrer por processo autônomo (execução clássica) ou como fase do processo de conhecimento (cumprimento de sentença).
O art. 515, VI a IX, do CPC especifica os títulos judiciais que ensejam execução autônoma, ainda que derivados de decisão judicial.
Ação mandamental
Tem por objetivo uma ordem direta do juiz ao réu, impondo-lhe o cumprimento imediato de determinada obrigação, sem necessidade de cognição aprofundada.
Exemplo: mandado de segurança determinando a reintegração de servidor público.
2. Quanto à prescritibilidade
A depender do tipo de direito discutido, a ação pode estar sujeita à prescrição, decadência ou ser imprescritível:
Ações condenatórias: sujeitas à prescrição, pois envolvem direitos subjetivos patrimoniais. Ex.: ação de cobrança de dívida.
Ações constitutivas: sujeitas à decadência, já que envolvem direitos potestativos, cujo exercício depende de prazo legal específico. Ex.: ação de anulação de negócio jurídico.
Ações declaratórias: em regra, são imprescritíveis, pois buscam apenas certificar ou afirmar uma situação jurídica, sem impor obrigações (ex.: ação declaratória de inexistência de vínculo empregatício).
Obs.: algumas ações constitutivas também podem ser imprescritíveis, quando não houver prazo legal previsto para seu exercício.
3. Quanto à relação jurídica discutida
Essa classificação considera o tipo de direito material que fundamenta a demanda:
Ações reais: baseiam-se em direitos reais sobre coisas, como propriedade ou posse. Ex.: ação reivindicatória, ação possessória.
Ações pessoais: derivam de obrigações contratuais ou extracontratuais, entre pessoas. Ex.: ação de cobrança fundada em contrato de empréstimo.
Exemplo esclarecedor: A ação de despejo, embora verse sobre bem imóvel, é ação pessoal, pois tem fundamento em contrato (locação). Já a ação reivindicatória de veículo é ação real, mesmo sendo bem móvel, pois se funda no direito de propriedade.
4. Quanto ao objeto do pedido mediato (bem jurídico)
Analisa-se aqui o bem da vida pretendido pelo autor, ou seja, o objeto final da demanda:
Ações imobiliárias: o pedido mediato recai sobre bem imóvel (ex.: ação de usucapião, reintegração de posse de imóvel).
Ações mobiliárias: envolvem bens móveis (ex.: ação de busca e apreensão de veículo).
Importância prática dessa classificação:
Define regras de competência territorial e de capacidade processual.
📌 Competência territorial:
Ações reais imobiliárias → foro da situação do imóvel (art. 47, CPC).
Ações pessoais e reais mobiliárias → foro do domicílio do réu (art. 46, CPC).
📌 Capacidade processual de pessoas casadas: Conforme art. 73 e §3º do CPC:
Para propor ou ser réu em ação que verse sobre direito real imobiliário, é exigida:
Autorização do cônjuge (salvo se houver separação absoluta de bens);
Ou a participação do cônjuge no polo passivo (litisconsórcio passivo necessário);
Essas regras se aplicam, por analogia, às uniões estáveis comprovadas nos autos.
Conclusão
O estudo da Teoria da Ação, conforme apresentado nas Anotações Acadêmicas de 08/04/2025, permite compreender um dos pilares do Direito Processual Civil: o direito de provocar a atuação do Poder Judiciário e obter a devida prestação jurisdicional.
Ao longo do artigo, foram analisados o conceito e a natureza jurídica da ação, as principais teorias doutrinárias sobre sua evolução, seus elementos essenciais — partes, causa de pedir e pedido — e suas diversas classificações.
A relevância prática do tema é evidente para o exercício da advocacia e da cidadania, pois a ação representa o instrumento formal pelo qual o jurisdicionado concretiza seu direito de acesso à Justiça.
Além disso, seu estudo é indispensável para compreender os limites objetivos do processo, a atuação do juiz, a formação da coisa julgada e o correto enquadramento das pretensões jurídicas.
Diante da constante aplicação da Teoria da Ação pelos tribunais brasileiros, especialmente sob a égide do CPC de 2015, o domínio conceitual e técnico desse instituto revela-se essencial para a atuação profissional crítica e eficaz.
Conhecer os elementos e classificações da ação é, portanto, condição necessária para compreender a estrutura e o funcionamento do processo civil contemporâneo.